Blog‎ > ‎

Escrever e falar melhor: As regras de ouro para a boa comunicação

posted Oct 26, 2012, 5:31 PM by Danilo Netto   [ updated Oct 26, 2012, 5:33 PM ]

                   Dois pelo preço de um, essa é a promoção oferecida por este texto: as regras primordiais da boa comunicação que se aplicam, a um só tempo, para a fala e a escrita. 

                  Para validar a ambição desse texto é conveniente, de imediato, verificar a relação entre essas atividades. A equivalência entre ambas está no compartilhamento do mesmo processo cognitivo de criação que, por sua vez, pode ser resumido em três simples etapas: 1) o desejo ou necessidade de expressar uma ideia; 2) a organização dessa ideia numa estrutura lógica; 3) a codificação dessa estrutura em uma ou mais mensagens. A partir daí resta apenas a etapa motora de movimentar a boca ou a mão – para os italianos ambos, pois o movimento é notoriamente conjunto.                 

                  Na teoria a mensagem é objeto que um emissor transmite a um – ou mais que um – receptor. A mensagem é formada pelo emissor por um processo de codificação, e recebida pelo receptor por um processo de decodificação. O escopo desse texto, vale frisar, está em tratar das regras envolvidas até a formação e envio da mensagem. Para tanto devemos, anteriormente, definir os elementos fundamentais que constituem a mensagem: a forma e o conteúdo.

A forma é um pacote definido: a) pela língua, através de suas expressões coloquiais e formais – com suas regras gramaticais e ortográficas; b) pela expressão, que pode ser escrita em prosa ou verso, falada, cantada ou mesmo manifestada artisticamente em pintura, escultura, etc; c) pela mídia, expondo a mensagem em jornais, revistas, televisões, rádios, blogs, redes sociais ou ao vivo 

O conteúdo é a representação de uma ideia, de um contexto, de um ponto de vista. Constitui o próprio objetivo da comunicação, a origem da necessidade e do desejo de se comunicar. Sem o conteúdo não existe motivo para a comunicação acontecer e esta seria, em essência, uma mensagem vazia, uma burocracia inútil expressa exclusivamente pelas regras da forma.

                  Vamos resumir forma e conteúdo numa metáfora bastante simples: conteúdos são peças de Lego, avulsas ou combinadas entre si, que você tem guardadas em seu baú de brinquedos – memórias armazenadas – e a forma são instruções para montar e mostrar essas peças juntas, de maneira organizada. A mensagem final é o brinquedo que você montou com as peças, usando as suas instruções. 

                  Essas são as definições mínimas para que falemos, enfim, das seguintes regras práticas:

Regra 0 – O Momento de falar e o momento de calar: Sim, esse senso de oportunidade é a manjedoura da boa comunicação. Para cada ímpeto de se manifestar, deve agir o fiel da balança que te conduz a fazê-lo ou se calar. Cabe a você desvendar os prós e contras de cada ato, sabendo se deve ou não satisfazer a coceirinha que domina a sua língua e os seus dedos;

 

Regra 1 – Tenha conteúdo: Essa regra é a número um por uma excelente razão: quem não tem conteúdo não tem muito a dizer, nem uma boa razão para se comunicar. As pessoas sem conteúdo se comunicam por cordialidade, socialização, mas, na verdade, são bastante desinteressantes.

                  Mas a questão não se resume a ser ou não interessante. As pessoas sem conteúdo não têm o que mostrar numa entrevista de emprego, numa reunião da empresa, num pedido de crédito ao banco, numa avaliação escolar, no vestibular, ou mesmo numa declaração de amor a pessoa amada.

Ou seja, se você deve se comunicar a respeito de algo, não tem muito o que fazer se você não sabe nada sobre o tema. Voltando ao nosso Lego: mesmo com as regras todas de montagem, nada pode ser feito se você não tem as peças para montar.

Como resolver isso? Simples: adquira conteúdo de qualidade. Existem boas fontes de informação em qualquer mídia, das impressas até as redes sociais. Balanceie a cultura de lixo com fontes que tragam informações valiosas para sua formação intelectual e cultural. Esse equilíbrio é fundamental e, dito em tempo, ninguém está exigindo que você seja erudito e que estude o dia inteiro.

Um erro muito comum, para pais e alunos, é achar que a escola provê todas essas informações importantes. Em boa parte sim mas, num mundo com tantas informações importantes sendo criadas e distribuídas a cada segundo, o aluno precisa adquirir um gosto genuíno pela boa leitura, e exercitá-la de forma regular. Alunos que leem mais são os que produzem, por exemplo, as melhores redações. Afinal, a base da educação contemporânea, como muitos sabem, está em aprender a aprender.

 

Regra 2 – Conteúdo é rei: Quando estamos nos comunicando,  a forma é uma variável, mas o conteúdo é uma constante. Mais que uma constante, é uma condição. Se a forma está atrapalhando o conteúdo, a forma deve ser revista, nunca o contrário. Em uma situação em que a forma prevalece, e o conteúdo fica em segundo plano, perdemos clareza, correndo o risco de não sermos entendidos.

As raras licenças são concedidas para artistas, já que podem buscar a manifestação artística como objetivo principal. O conteúdo é assimilado por um processo indireto e convidativamente reflexivo, justamente o que torna a arte interessantemente contemplativa e provocativa.

Se você não está expressando sua veia artística – o que corresponde a prováveis 99% de sua necessidade diária de comunicação – lembre-se que o conteúdo é o rei. Coloque-o em primeiro lugar.

 

Regra 3 – Estrutura é sustentação e beleza: Como numa casa, é a estrutura que faz a obra ficar de pé, firme e forte, e também o que a torna atraente. E estrutura não se resume a selecionar os melhores materiais, mas também em aplicar uma arquitetura que aproveite suas características fundamentais, numa organização ótima, sinérgica e elegante.

                  Perceba a relação disso com a comunicação. Os melhores argumentos, trazendo o conteúdo mais interessante, não significam muito sem uma estrutura lógica que aproveite suas forças.

                  Planeje a forma de apresentar suas ideias, seus argumentos, o contexto da mensagem. Organize a relação entre os assuntos e como eles dependem um dos outros, tornando a mensagem lógica, fluída e interessante. Os interlocutores devem ser capazes de assimilar suas ideias sem perceber cortes bruscos na mensagem, evitando  trancos entre sequências de idéias sem relação aparente entre si.

                  Note que a estrutura lógica é a redenção da importância da forma frente ao conteúdo. Afinal de contas, sem a forma, o conteúdo é abstrato, vago, incomunicável. Podemos reconhecer, portanto, que forma é também expressão de conteúdo e, em nossa obra, é a indispensável argamassa que une ideias na coesão do todo.

Estrutura é a elementar manifestação da forma, é o convite que você oferece para ser ouvido. E deve ser ainda, para os já têm o traquejo de injetar estilo à obra,  o olhar arquitetônico que complementa a pragmática definição da engenharia de conteúdo.

 

Regra 4 – Saiba onde você quer chegar:  A boa comunicação exige que você desenvolva ideias com um objetivo em mente. Regra simples e direta, mas extremamente importante.

                  Um dos capítulos do livro milenar, a Arte da Guerra, trata desse ponto: “Se você não sabe onde quer chegar, qualquer caminho o levará para lá”. Mestre Sun está correto, os caminhos para se atingir um objetivo só podem ser trilhados, ou mesmo conhecidos, quando você sabe qual é o objetivo.

Quem tem o objetivo claro tem mais facilidade, sempre, para se fazer transparente em suas mensagens. Ele é um norte e, como tal, funciona como uma bússola apontado a direção a trilhar no desenvolvimento de seus argumentos.

Os esportistas têm um jargão de ordem prática que se aplica aqui: “não tirar os olhos da taça“.  É exatamente isso. Transforme seus objetivos numa obsessão saudável a perseguir. A medida que se tornar melhor nessa arte mais as pessoas vão, realmente, ouvir e entender você.

 

Regra 5 – Seja claro e, na dúvida, simplifique: Lembre-se que seu objetivo principal é ser entendido. Procure a forma mais clara e direta de se expressar, sem perder a exatidão da ideia.

Lembre-se ainda que simples é o mínimo para ser exatamente entendido, e simplista significa que você está deteriorando a ideia principal, por simplificar demais. Seja simples, não simplista.

Bons comunicadores, como oradores ou escritores, compõe um estilo que faz parte da mensagem. Se você consegue incorporar estilo, sem detrimento da compreensão, ótimo - a licença concedida aos artistas já foi dada, e também vale aqui.

Se você ainda não chegou lá, vale reforçar: simples não é estúpido. O que é estúpido é complicar e não se fazer entender.

 

Regra 6 – Escute você mesmo: Se você acha que não está se fazendo claro, muito provavelmente você não está mesmo. Escute-se sempre.

Quando falando, se você acha que algo não soou bem ou ficou esquisito, se corrija ou se explique novamente. Não assuma que os outros entenderam algo que você mesmo ficou na dúvida.

Quando estiver escrevendo, o processo é mais seguro. Apenas leia tudo o que escreveu e, se algo não parecer claro para você, reescreva até que se sinta transparente. A beleza de escrever é que se trata de um processo assíncrono de comunicação. Escreveu e não curtiu? Apague e corrija. Os outros não vão saber do processo de criação, apenas do resultado final.

 

Regra 7 – A pontuação é sua amiga: Seja na linguagem falada ou escrita, a pontuação torna a sua mensagem inteligível. Aprenda a pontuar e aplique uma atenção enorme a esse ponto – desculpem-me pelo trocadilho.

                  A pausa é absolutamente importante para que cérebro possa decodificar a mensagem. Se você não usa a pontuação adequada, vai fazer com que os receptores de sua mensagem fiquem loucos. Pausas demais fazem com que eles tenham a impressão de estar lendo um telegrama. Pausas de menos, por suas vezes, fazem com que sintam que o pulmão vai implodir por falta de ar.

                  Entender a implicação de ritmo que vírgula, ponto final, dois pontos e ponto-e-vírgula tem numa frase não é pedir muito. Na verdade, é o básico.

                  Existe uma regra simples também para sentenças: prefira-as mais curtas. Construa-as mais longas a medida que estiver se sentindo mais a vontade com a pontuação.

 

Regra 8 – Adiante a sua tese:  Não faça suspense, adiante a sua tese para que saibam onde você quer chegar. Você não precisa incorporar Stephen King quando estiver se comunicando.

                  Tese não é conclusão. As pessoas não vão achar que você concluiu só porque apontou, de antemão, seu norte. Você ainda tem o tempo que precisar – de acordo com cada situação, claro – para apresentar seus argumentos e concluir.

                  Trabalhar argumentos com tese oculta, em algumas situações,  é uma vantagem, como esconder seu objetivo num jogo de xadrez. Use dessa posição dialética quando estiver confortável, e quando a plateia suportar esse jogo.

 

Regra 9 – Leia ou assista quem se comunica bem: Temos uma facilidade maior em aprender por exemplos. Sendo assim procure ter referência de bons comunicadores. Preste atenção em suas técnicas, explore suas construções de frase, suas organizações de ideias.

                  O objetivo não é copiar o estilo, isso é muito próprio, mas tentar aprender um pouco com eles. E isso vai funcionar melhor se você estiver lendo ou ouvindo de um assunto que goste. Se existe interesse, existe atenção. Nunca é demais lembrar, contudo, que quanto mais diversidade em assuntos de seu interesse, melhor.

 

Regra 10 – Não use palavras que você não domina: Algumas palavras difíceis, quando bem utilizadas, em algumas situações, podem fazer com que a pessoa pareça mais culta. Mas palavras difíceis usadas de forma errada, sempre, fazem a pessoa parecer mais idiota. Na dúvida, não aposte; pesquise antes o termo num dicionário.

Aos olhos dos outros, raramente alguém ganha pontos de QI por acertar palavras difíceis, mas sempre perde pontos ao usar palavras de forma errada.

 

Regra 11 – Tente se comunicar bem, sempre que o fizer:  Ainda que alguns jogadores de futebol discordem, costumamos jogar como treinamos. Se treinamos errado, em momentos que achamos não ter importância, as chances são grandes que joguemos também desfalcados.

                  Ou seja, sempre se esforce para falar e escrever certo, de forma clara. Evite atalhos na escrita quanto estiver em redes sociais, e também em ferramentas de chat.

                  Vários alunos costumam transportar para as provas e produções escritas esses mesmos modismos. As oralidades por exemplo, manifestadas em escrita, são consideradas um erro, e não vão fazer você parecer “cool“, mas sim evidenciar uma certa desqualificação.

 

Regra 12 – Entenda seu público:  Se existe comunicação, seja de que forma, uma ou mais pessoas estão recebendo mensagens. E, após recebê-las, elas devem decodificá-las para captar seu conteúdo. Lembre-se que você não está se comunicando com você mesmo, mas com um público alvo, com uma capacidade de decodificação possivelmente diferente da sua.

                  Isto significa que, em determinadas situações, você deve ajustar conteúdo ou forma para ser entendido; já em outras, pode assumir liberdade maior e explorar seu repertório. Só levante o nível, portanto, quando seus interlocutores acompanharem. Resista a tentação de mostrar sua intelectualidade, prefira ser compreendido.

Comments